Alegrias e desafios de ser família em quarentena


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07/05/2020 #Artigos #Editora Concórdia

Conciliar trabalho, casa, escola e crianças e ainda encarar o fato de fazer tudo isso em um momento de pandemia, pode ser bem desafiador

Alegrias e desafios de ser família em quarentena

Os desafios de pais e mães já não são fáceis em tempos normais. Em tempos de coronavírus, pandemia e quarentena, eles podem se multiplicar. Conciliar trabalho, casa, escola e crianças e ainda encarar o fato de fazer tudo isso em um momento em que as tensões estão à flor da pele, pode ser bem desafiador.

Cada família tem seu jeito, sua história e sua maneira de fazer este tempo ser o mais tranquilo possível e, quem sabe, ainda criar memórias nas crianças que serão para sempre. Sejam elas memórias de momentos em família, em casa ou aquela de poder dizer “Minha mãe, ou meu pai, trabalhou para ajudar quem mais precisava”. Ambas são especiais. Ambas são importantes. E ambas podem mostrar aos filhos o mais doce e incrível amor: o amor de Deus por todos!

Conversamos com algumas famílias que nos contaram como estão vivendo este tempo de quarentena e pandemia. Quais são as alegrias e os desafios de ser e estar em família neste momento?

“Não ter a escola fez com que a gente tivesse que reorganizar muita coisa da nossa rotina. Como eles iam de manhã para a aula, decidimos manter esse período para realizar as atividades escolares. A cada dia escolhemos algo que eles possam fazer e tentamos agilizar alguma coisa do trabalho enquanto eles estudam. Depois, acabamos conseguindo fazer mais coisas do trabalho à tarde, quando eles estão brincando. Uma mudança boa é que agora estamos conseguindo fazer atividade física todos juntos no fim da tarde. Já tínhamos estabelecido o tempo depois da janta como o “tempo em família” e continuamos fazendo isso. Nós geralmente jogamos algum jogo juntos, fazemos uma hora de leitura e devoção. Inclusive, o livro Horinhas com Deus é um material muito legal!

Para nós que somos uma família formada pela adoção, ter este tempo de convivência intensa em casa acaba sendo algo bem importante. Em agosto completam-se dois anos que os meninos moram com a gente, mas, apesar disso, ainda estamos em adaptação como família, e poder estar mais perto, conversar mais, conhecer mais um ao outro é fundamental para fortalecer o vínculo. Apesar de manifestarem tristeza por não podermos passear, ir à escola ou visitar os amigos, eles têm demostrando também bastante alegria em estar conosco e em compartilhar o que fazem com a gente. Tenho percebido mais manifestações de carinho e valorização do tempo de brincadeira juntos. Esse tempo de quarentena também tem ajudado eles a perceberem a importância de cada um fazer a sua parte, como nas atividades domésticas, por exemplo.

Acredito que as atividades escolares sejam o maior desafio para nós. É uma alegria poder acompanhar mais de perto a educação escolar deles. Ver como eles estão evoluindo e aprendendo rápido é motivo de gratidão. A questão é que nós continuamos trabalhando, e é bem desgastante equilibrar as duas coisas. Acaba que a nossa rotina de trabalho muitas vezes fica bem bagunçada, o que gera ansiedade. Outro grande desafio é regular nossas emoções. Estamos tentando nos permitir sentir os medos, tristeza, saudade... buscamos fazer coisas para fortalecer nossa saúde física, mental e espiritual. Apesar de toda essa situação triste e desagradável, estamos tentando manter a fé de que nosso Pai está cuidando de tudo e a esperança de que vai passar logo.”

Miguel, Luise, Vagner (12 anos) e Israel (6 anos) Dolny

Florianópolis, SC

 

“Ser um adolescente nunca foi tarefa fácil. Muitos são os desafios e as obrigações que enfrenta em seu dia a dia. Samira, nossa filha de 15 anos, recentemente havia ingressado num dos melhores colégios federais do Brasil. Enfrentou uma prova muito concorrida do Técnico em Música do Instituto Federal de Goiânia, GO, que gerou ansiedade e exigiu extrema dedicação para conseguir a vaga. É frustrante para uma adolescente que estava atrás de um grande sonho. Depois de tanta dedicação, não ter nem aulas pela internet, a deixou extremamente sem rumo. É claro que precisamos ficar em casa por causa da pandemia, e a Samira compreende isso perfeitamente.

Contudo, apesar das brigas terem se intensificado logo no começo, por conta das frustrações e de estarmos confinados num apartamento, outras práticas estão nos deixando aos poucos mais calmos, mais próximos, e aquela sensação de estarmos ‘sem rumo’, quase se esvaindo.

A mais relevante de todas as práticas que mudaram aqui em casa, é que antes não tínhamos tempo para os devocionais em família. A vida corrida da congregação, além dos nossos trabalhos e estudos, tomava conta do nosso tempo. Foi possível perceber que estamos sem rumo apenas para as coisas terrenas, mas que o nosso verdadeiro rumo sempre foi e continuará sendo Jesus.

Outra prática que não posso deixar de contar são os ensaios em família para as gravações dos cultos que meu marido, Filipe, que é pastor, está fazendo online. Antes, nunca tínhamos tempo para nos dedicar aos ensaios musicais. Agora podemos ensaiar e até mesmo tocar e cantar músicas apenas por hobby. Se não fosse nossa filha, estaríamos perdidos com esses cultos online. Além de tocar conosco, já filmou alguns cultos. O Filipe aos poucos está se virando sozinho, mas ainda precisa da filha para ajudá-lo em muitos afazeres.

Samira e eu também temos tempo para fazer novas receitas. Estamos no desafio de fazer receitas saudáveis, que a nossa gastroenterologista sempre exigia e nunca tínhamos tempo para cozinhar. Na esteira dessa mesma prática fitness, Samira está fazendo exercícios físicos online com o namorado, que fica em Novo Hamburgo, RS. Além disso, ainda estamos fazendo maratonas de filmes e séries.”

Isabel, Felipe e Samira Schneider

Goiania, GO

 

“O maior desafio deste momento é ser, além de mãe, professora. Precisamos tirar um tempo maior que o habitual para nos preparar e depois ensinar o que a escola está propondo. Estou aprendendo com isso tudo, mas está cansativo.

Os desafios são tantos. A gente se cobra muito. O maior deles é proporcionar dias agradáveis às crianças. Apartar os desentendimentos também é difícil.

As alegrias também são muitas: aprendemos mais com as emoções à for da pele! Aprendemos a conversar com eles, a brincar. Meu marido e eu estamos nos tornando crianças de novo. Estamos reaprendendo a ser família.”

Everton, Iracema, Davi (7), Artur (4), e Miguel (1)

Ponta Grossa, PR

 

“As crianças estão em nossa casa desde o final de novembro de 2019. Antes eu e o Rahel tínhamos total liberdade, porque ninguém dependia de nós, nossa rotina era adaptada somente às nossas necessidades ou vontades. Agora organizamos a rotina em função das crianças, tivemos que desacelerar em várias áreas, especialmente no trabalho – eu e o Rahel empreendemos e antes tínhamos muito mais disponibilidade para trabalhar até tarde ou nos finais de semana. Já sabíamos que tudo mudaria radicalmente e preparamos nossa vida para isso. Também temos muito apoio da família e de amigos queridos, o que tornou essa transição de rotina muito mais tranquila.

Nós tentamos criar algo positivo em meio ao caos que, em si, é totalmente negativo. O que estamos fazendo é sendo intencionais em criar momentos para que eles tenham boas lembranças dessa fase. Tudo o que está acontecendo está totalmente fora da capacidade de compreensão deles mas sabemos que estamos vivendo um momento histórico, nossos filhos irão contar para os filhos deles sobre como foi viver essa época. O que queremos é que eles possam lembrar de coisas positivas, como o acampamento na sala de casa, os piqueniques no tapete do quarto e a folia de fazer pão em casa. O momento de aproximação na adoção, que é o que estamos passando, é feito de muitas alegrias e também desafios. Certamente não escolheríamos passar por essa fase durante a quarentena se estivesse em nosso poder escolher, mas sendo essa a história que Deus está escrevendo, tentamos fazer o melhor que está ao nosso alcance.

O maior desafio é lidar com a impossibilidade de ter contato com quem amamos, nossa família e nossa congregação especialmente – somos um grupo muito próximo. Tanto nós, como também as crianças, sentimos muita falta do convívio. A isso se soma a preocupação com quem amamos e com a situação do mundo como um todo. A maior alegria tem sido servir à nossa família de forma bem intensa e ver Deus abrir portas para servirmos a outras pessoas mesmo numa situação tão adversa. Também intensificamos nossos momentos de devoção e louvor em família. Vivemos uma vida de muitas bênçãos e temos exercitado muito com as crianças a gratidão a Deus por ele suprir todas as necessidades.”

Carolina Strelow C. Lehenbauer, Rahel Lehenbauer, Moisés e Juliana.

Florianópolis, SC

 

“Nos reorganizamos, tanto na rotina quanto no espaço físico, para que eu pudesse atender a Sarah, de 3 anos e o Benjamin de 4 meses, juntos. Estruturamos nossa área gourmet com espaço de atividades e brinquedos, assim, no mesmo ambiente consigo fazer os afazeres da casa.

Fazemos atividades diversas, que são simples, com materiais que temos em casa. Caixas de papelão viraram lugar preferido de canetinhas e tinta. Água com corante e alguns instrumentos de transferência são sempre sucesso. Massinha caseira e assim vai. Cada dia inventamos algo e tem dia que é por conta da imaginação dela. Nesse período também estamos fazendo as atividades propostas pela escola.

Neste tempo estamos todos mais calmos. Sem a pressa e correria dos dias normais. Isso traz mais leveza, menos stress. Mas, claro, mesmo sem horários tão fixos, temos a rotina. Brinco dizendo que nossos dias têm sido guiados pelo sol, literalmente.

É desafiador estarmos 24 horas em função das crianças, sem apoio externo, sem poder dar uma volta ou viajar nos fins de semana. Demandam muito! Ao mesmo tempo é uma alegria desfrutar de todos os momentos, sem perder nada. Acompanhar o desenvolvimento de pertinho e perceber que nós (pais) somos porto seguro, somos casa para nossos filhos.”

Sabrina, Amir, Sarah e Benjamin Matos

Mundo Novo, MS

 

“Eu tenho dois filhos. A Marina, de 9 anos, e o Gabriel de 15. Marina está tendo videoaula, e Gabriel está tendo aula pela TV Justiça. E eu estou trabalhando como nunca, cerca de 12 a 14 horas diárias. Sou dentista e trabalho como apoio da coordenação do Sesc Distrito Federal. Nós estamos fazendo um trabalho de atendimento às urgências odontológicas de todo o DF, não só do SESC. Somos os únicos a oferecer esse serviço e estamos atendendo cerca de 80 pessoas por dia. Então não está sobrando muito tempo para acompanhar as crianças. Meu marido está em home office, mas também não tem todo o tempo para conseguir acompanhar, pois está com as tarefas de casa, como cozinhar, lavar a louça, dar um jeito na casa. Tivemos uma mudança bem grande na nossa rotina. E, por conta disso, os filhos estão mais carentes.

Eu trabalho num ambiente todo contaminado. Então fizemos todo um esquema na porta de casa, de limpeza, para não entrar com nada sujo. E eu fico com dó, pois quando eu chegava eles logo me abraçavam e beijavam. Eles sentem muito por não poder fazer isso.

Os maiores desafios são os relativos à escola, aos deveres. Eu me preocupo muito quando a gente retornar, com a cobrança, principalmente em relação ao Gabriel, que é autista, em que se exige uma adaptação do conteúdo para que ele possa entender melhor. E agora ele não está tendo essa adaptação. Todas as terapias dele foram adiadas. Ele tem sentido falta, apesar de estar com tempo livre para fazer o que gosta: jogar videogame, ouvir música e assistir a filmes. O Gabriel já tem um comportamento mais organizado. Mas tem mães que reclamam muito, pois as crianças são menores e ainda não estão adaptadas a um comportamento mais tranquilo socialmente. E é um mundo que muitas vezes não é olhado. Se para uma mãe que tem uma criança neurotípica, ou seja, aquela que não tem nada, está reclamando do excesso de carga de atividades dentro de casa, a mãe que tem criança com alguma necessidade especial sente muito mais. Mas aqui em casa temos um garoto muito legal, que está bem estruturado, que já passou por anos de terapias das mais diversas. Hoje em dia ele está tranquilo.

Como profissional da saúde, a minha presença em casa está bem prejudicada. Inclusive final de semana, quando eu preciso me dedicar também a estatísticas e relatórios, até para respaldar mais ainda a importância do serviço que estamos fazendo frente a essa pandemia. É um trabalho social onde a gente precisa colocar em prática o ajudar o próximo. São pessoas que não tem a quem recorrer, estão com dor de dente, às vezes há meses e até anos. E eles estão vendo agora a oportunidade de ter esse atendimento gratuito.

Profissionalmente é muito importante colocar em prática esse serviço. Então, ao mesmo tempo que eu vejo que em casa está sacrificante, por conta de todos esses desafios, profissionalmente estou me sentindo muito útil, porque vejo a importância da minha profissão frente a uma população carente. Eu sei que é Deus quem está guiando, está me colocando num lugar onde eu seja útil. Às vezes me tira algumas coisas, mas me proporciona outras que são também muito gratificantes e importantes para alguém. Então nessa hora colocar o servir ao próximo de maneira linda, de maneira pura e de forma que a gente pode visualizar o amor ao próximo, está valendo a pena! Mesmo cansada, eu estou muito feliz.”

Gustavo, Gabriel, Marina Lima e Erica Souza

Brasília, DF    


Daiene Bauer Kühl
Equipe editorial

Colaboração Natacha Teske

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